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quinta-feira, 27 de março de 2014

I-Anti -Édipo:Uma Introdução À Vida Não-Fascista; Por Michel Foucault

Durante os anos 1945-65 ( penso na Europa ), havia uma maneira correta de pensar , um certo estilo discurso politico , uma certa ética do intelectual . Era preciso estar na intimidade com Marx , não deixar seus sonhos vagabundos  muito longe de Freud , e tratar os sistemas dos signos - O significante - como o maior respeito.Tais eram as três condições que tornavam aceitável esta ocupação singular que é o fato de escrever e de enunciar uma parte da verdade sobre si mesmo e sua época.
Depois viriam cinco anos breves anos., apaixonados, cinco anos de júbilo e de enigma.às postar do nosso mundo, o Vietnã, evidentemente , e o primeiro frande golpe levado aos poderes constituídos. Mas nos interiores de nosso muros, o que se passavam a  exatamente ? Uma Amálgama de política revolucionária´naria  e anti-repressiva? Uma guerra levada em duas frentes -a exploração social e a repressão psíquica ? Uma elevação da libido modulada pelo conflito de classes? É possível. Seja o que for , é por esta interpretação familiar  e dualista que se pretendeu explicar os acontecimentos deste anos . O sonho que  entre a I Guerra  Mundial e o acontecimento  do Fascismo , havia tido sob seus charme as Frações mais utopistas Da Europa -a Alemanha de Wilhem Reich e a França dos surrealistas -Havia retornado para abarcar a própria realidade ? Marx e Freud Iluminados pela mesma incandescência.
Mas foi bem isto que se passou?Tratou-se de uma retomada do projeto utópico dos anos 30, desta vez à escala da prática histórica ?Ou houve ao contrário , um movimento em direção às lutas politicas que não se conformavam maios com  o modelo prescrito pela tradição marxista. Em direção de uma experiencia e uma tecnologia do desejo que não eram mais freudianas? certamente Brandiram-se os velhos estandartes , mas o combate se deslocou e ganhou novas zonas.
O Anti-Édipo mostra , em primeiro lugar, a extensão do terreno coberto.Mas é preciso muito mais . ele não se dissipa no denigrimento dos velhos ídolos , mesmo se ele se diverte muito com Freud . E sobretudo , nos incita a ir mais longe.
Seria um erro ler o Anti-édipo como a nova referencia teórica  (sabe, esta famosa teoria que nos anunciaram tantas vezes :aquela que vai englobar, aquela que é absolutamente totalmente e tranquilizadora, aquela que , nos asseguram , da qual  - temos tanta necessidade , nesta época de dispersão e de especialização, de onde - a esperança desapareceu). Não é preciso procurar uma -filosofia- nesta profusão extraordinária de noções e de conceitos-surpresa: O Anti-Édipo não é um Hegel  escandaloso. A melhor maneira , creio eu, de ler O Anti-Édipo é abordando-o com uma arte no sentido em que se fala da -Arte erótica- , por exemplo. Apoiando-se sobre as noções aparentemente abstratas de multiplicidades , de fluxos, de dispositivos e de alternativas , a analise da relação do desejo com a realidade  e com a -Máquina- capitalista traz respostas a questões  concretas . Questões que se preocupam menos com o -porque- das coisas que com seu -Como- .Como se introduz o desejo no pensamento , no discurso, na ação?  Como o desejo pode e deve despender suas forças na esfera do politico e de intensificar no processo d mudança da a ordem estabelecida? Ars erotica, ars theorethica , ars politica. 
Dai os três adversários com os quais o anti -Édipo se encontra confrontando. Três adversários que não tem a mesma força que representam graus diversos de ameaça , e que o livro combate por diferentes meios.
1-Os ascetas políticos, os militantes morosos , os terroristas da teoria , aqueles que queriam preservar a ordem pura da politica e do discurso politico. Os Burocratas da revolução e os funcionários  da verdade.
2-Os deploráveis técnicos do desejo - os psicanalistas e semiólogos que registraram cada signo e sintoma e que querem reduzir a organização múltipla do desejo à lei binária  da estrutura e da falta.
3-Enfim, o inimigo maior, o adversário estratégico (já que o oposição de Anti-Édipo a seus outros inimigos constitui antes um engajamento tático): o fascismo .E não apenas o fascismo histórico de  Hilher e Mussoline que se soube tão bem  mobilizar e utilizar  o desejo de massas - mas também o fascismo que está em todos nós , que assombra nosso espirito e nossas condutas cotidiana as , o fascismo que nos amar o poder, desejar esta coisa mesma que nos domina e  nos explora.
Eu diria que O Anti-Édipo ( que seus autores me perdoem ) é um livro ético , o primeiro livro de ética que foi escrito na França desde há muito tempo (é talvez a razão pela qual o seu sucesso não se limitou a um -Leitorado Particular-: ser anti-édipo tornou-se um estilo  e vida , um modo de pensamento e de vida). Como fazer para não crê ser um militante revolucionário ? Como Desembaraçar nosso discursos e nosso atos, nosso coração e nosso prazeres do fascismo? Como caçar o fascismo que se instaurou em nosso comportamento ? Os moralistas cristãos procuravam os traços de carne  que estavam alojados nas dobras da alma . Deleuze e Guattari , por sua parte, vigiam os traços mais ínfimos do fascismo no corpo.
Rendendo uma modesta homenagem a S.Francisco de Salles*,pode-se dizer que o Anti-Édipo é uma introdução à vida não-fascista.
Esta arte de viver, contrária a todas as formas de fascismo quer estejam já instaladas ou próximas do ser, se faz acompanhar de um certo numero de princípios essências , que eu resumiria com se segue , se tentasse fazer deste grande livro um manual ou um guia da vida cotidiana.
-libere a ação politica de toda forma paranoica unitária e totalizante.
-faça crescer a ação , o pensamento e os desejos por proliferação , justaposição e disjunção, antes que por submissão e hierarquização piramidal.
-libere-se das velhas  categorias do negativo (a lei, o limite, a castração, a lacuna) que o pensamento ocidental por tanto tempo manteve sagrado enquanto forma de poder e de modo de acesso à realidade .Prefira o que é positivo e múltiplo , a diferença à uniformidade , considere que o que é produtivo não é sedentário, mas nômade.
-Não imagine  que precise ser triste para ser militante, mesmo se a coisa que combatemos é abominável.É  o elo do desejo á realidade ( e não sua fuga nas formas de representação) que possui uma força revolucionária.
-Não utilize o pensamento para dar a uma pratica politica um valor de verdade ;nem a ação politica para desacreditar um pensamento , como se ele não fosse se não pura especulação . Utilize a pratica politica como um intensificador ,e a analise como um multiplicador das formas e dos domínios de intervenção  da ação politica.
-Não exija da politica que ele a restabeleça os direitos dos indivíduos, tais como a filosofia os definiu.O individuo é produto do poder.O que é preciso é -Desindividualizar-pela  pela multiplicação e pelo deslocamento , pelo agenciamento de combinações diferentes.O grupo não deve ser o elo orgânico que une os indivíduos hierarquizados, mas um constante -Desindividualização-.
-Não se apaixone pele poder.
Poder-se ia mesmo dizer que Deleuze e Guattari gostam tão do poder que procuram neutralizar os efeitos do poder ligados a seu próprio discurso. Dai os Jogos e armadilhas que se encontram um pouco em todo o livro , e que fazem de sua tradução uma verdadeira prova de força. Mas não são as armadilhas familiares da retórica , aquelas que procuram seduzir o leitor sem que ele esteja consciente da manipulação,e acabam por ganhá-lo para a causa dos autores contra a sua vontade. As armadilhas de O Anti-Édipo são aquelas do humor :tantos convenientes a se deixar expulsar , a autorizar o adeus  ao livro em fechando a porta . O livro leva muitas vezes a pensar que ele é senão humor  e jogo  lá onde, no entanto , qualquer coisa de essencial acontece,qualquer coisa que é da maior seriedade: caça a todas  as formas de fascismo ,deste aquele s, colossais , que nos  circundam e nos comprimem, até as formas pequenas que fazem a amarga tirania de nossas vidas cotidianas.

*Homem da igreja do sec.XVII, que foi cardeal de Genebra.É conhecido por sua Introdução a vida devota.

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